quinta-feira, 28 de maio de 2009

Oh, céus, Dona Alzira

........Um cachorro, que só pode ser o da vizinha de baixo, late. Vou até a janela para ver se faço alguma coisa e acabo vendo o bichinho entre os anões de porcelana e não posso fazer nada.
........Entre o animal e eu, de assalto, o sutiã da dona Alzira me toma a vista. Um baita aparato, com restos de renda nas bordas e talvez uma mancha da última amamentação. Minha nossa, dona Alzira, deve fazer uns 35 anos...
........Saio dali, pois ela começa a se vestir na minha mente. Aparece de seu amarelado banheiro de ladrilhos azuis com os ombros respingados. Larga a toalha e começa o serviço.
........Coloco uma música, vou até a cozinha, como uma maçã, lavo a louça, socorro. Tomara que o cachorrinho não entre na história, tomara, tomara, tomara...
........- Bééé! - toca a campainha.
........Atravesso o olho mágico e oh céus, dona Alzira, o que tais fazendo aí?
........- Olá, mocinho. Esta sua cueca caiu no meu dunguinha. E já vou lhe avisando que da próxima vez é você quem irá buscar suas intimidades no meu apartamento.
........Como ela sabe que essa cueca é minha?
........- Pode deixar, dona Alzira.
........Sutiã velho, tetas escorridas, cracas de amamentação. Não seria do cara do 401? O dunguinha saindo do banheiro azul com rendas na cueca amarelada.
........Procuro pelas paredes alguma fotografia que me salve das visões e ... encontro Bresson. Ah, a arte de fotografar. Corro até ele.
........Mas que engano. Bresson e seu humor decisivo. A foto mostra uma bicicleta apoiada num outdoor com dois peitos gigantescos.
........E de novo a torrente: sutiã, anões, amarelo, bicicleta, Bresson, França, sim! A amiga que me deu a foto. Acabo lembrando de sua viagem por Paris, seu sutiã de rendas azuis, suas tetas sardentinhas.
........Aliviado, pude, então, sentar e escrever essa história.

27/05/2009

segunda-feira, 18 de maio de 2009

O terceiro mamilo

O terceiro mamilo

.......Entender é uma coisa que não dá.
.......Faz um bom tempo que tive uma verruga nas costas. Era uma coisa fofinha, do tamanho de um grão de bico. Ficava logo abaixo da escápula e meus amigos chamava de “o terceiro mamilo”.
.......Acontece que minha namorada tinha tesão pela verruga.
.......O que eu podia fazer? Deixava ela chupar aquilo até agarrar minha mão e mostrar a calcinha molhada.
.......O corpo masculino sempre me pareceu fraco de atrativos, então fiquei contente em possuir uma jóia incrustada às costas. Mas, no dia a dia, ela me incomodava: as pessoas queriam apertar o “mamilo”, saber se doía ou se era bom encostar.
.......Me surpreendi que minha namorada não viu a verruga com repugnância quando nos conhecemos. Ficara curiosa. Depois, imaginava que, como um mamilo, ela transmitiria arrepientas sensações de regozijo. Lambia ao redor, mordia, puxava de leve com os lábios. Eu não sentia absolutamente nada. Mantinha minha atenção em alguma parte do seu corpo e, com muito esforço, tentava sustentar a concentração. Cedo ou tarde, ela não aguentaria mais: tiraria sozinha sua roupa, pois eu não conseguia fazer isso de costas, e me botaria dentro da história.
.......Porém, as pessoas me perguntavam se eu já havia ido a um médico para saber se aquilo era um câncer ou se me traria ainda algum problema. Não era a primeira vez que sugeriam que eu tirasse aquilo. Mas como era parte do sexo, resolvi não mexer no assunto. Só que aquela história de câncer ficou rondando.
.......Quando visitei minha vó, acabei mostrando a ela o terceiro mamilo e pedi alguma sugestão.
.......- Isso não é nada guri. Podemos ir na Dona Alaíde benzer essa bolinha que já passa.
.......- Mas vó, não dá para fazer alguma coisa menos... bizarra?
.......- Hum.
.......Foi ao banheiro, pegou um pedaço de fio dental e disse para eu não me mexer.
.......- Pronto. Agora ela cai sozinha.
.......Não fiquei muito satisfeito, tenho que confessar, mas a vó me assegurou que tudo se resolveria em, no máximo, duas semanas.
.......Voltei para casa e contei para Cida o que tinha feito. Ela ficou tristonha, mostrou um biquinho, mas disse que era melhor assim, pois vai que vira uma pereba e se alastra para outras partes do corpo?
.......Por uma semana, a verruga se portou bem, murchando lentamente e Cida continuava investindo nela. Porém, numa terça-feira, o mamilo começou a pretear. Eu olhava pelo espelho, todo contorcido, mexia, puxava um pouquinho a linha branca e sentia já uma dorzinha. Cida disse para ir ver minha vó, mas não fazia sentido, em mais quatro dias tudo estaria resolvido. Ela mesmo dissera.
.......Só que passou uma semana e o terceiro mamilo estava preto, inchado e com uma casca por fora, como se fosse sangue coagulado. Minhas camisetas estavam todas manchadas do líquido amarelo que saía e os lençois também.
.......Cida, mais uma vez, me surpreendeu. Viu na verruga outra de suas predileções: uma uva passa. O que tinha sido um grão de bico se transformara numa túrgida uva-meio-passa e ela adorava aquilo. Não se excitava mais com ela, porém continuava chupando e lambendo e mordendo, pois, afirmava dengosamente, me ajudava, limpava e cuidava do problema.
.......- Isso é loucura!
.......- Não se mexa, oras. Já, já ela cai.
.......E lambia e lambia e, quando vi, estava se masturbando.
.......No dia seguinte, chegando do trabalho, resolvi acabar com aquela maluquice. Cida que chupasse meu dedão do pé ou lambesse meu suvaco, mas aquela verruga já tinha ido longe demais.
.......Peguei uma tesoura e fui ao espelho. Durante meia hora tentei arrancar a verruga, esmaguei o grão de bico, cortei a uva passa e gritava de dor. Num ímpeto de raiva, agarrei o mamilo e ...
.......Cida me encontrou no chão, com um corte no queixo. Ajudou-me a sentar na patente e lambeu meu machucado fazendo carinho na nuca. Sabia o que tinha acontecido e não se zangara. Levou-me até a cama, tirou minha roupa e começou a me lamber e chupar e se masturbar como se nada tivesse acontecido.

10 de maio de 2009

quarta-feira, 6 de maio de 2009

A quase história daquele cofre

..........Quando se encontra um cofre jogado na rua, todo tipo de obviedades aparecem. O que há de valioso dentro? Como veio parar ali? Ladrões perderam sua carga? Receberei alguma recompensa por tê-lo encontrado? Será que o dono vai aparecer ou podemos arrombar agora?

..........Neste caso, quando a mídia inventa suas explicações e a polícia fica olhando para o fim da rua como se fosse aparecer alguém gritando com uma chave na mão, um cofre no meio da rua não passa de entulho estorvando a passagem. Mas sempre há a esperança de que guarde muito dinheiro, ou um corpo, ou qualquer coisa que valha uma história.

..........Porém, não foi bem assim. Se tivessem examinado com menos impulsividade, saberiam que tudo não passava de lixo. O cofre enferrujado, largado sem cuidados ao lado de um poste, numa calçada de bairro classe média não podia ter mais que duas moedas, dois cruzados, coisa que nem criança tem vontade de brincar.

..........Só que criança vê as coisas diferente. Desde o começo já seria uma mirabolante história de submarino, ou foguete espacial, ou trenó de corrida na grama. Mas elas não podem chegar perto. A polícia afasta as pessoas e os pais dizem para voltar para dentro.

..........Assim foi quando duas moedas fecharam mais um dia de expectativas frustradas.

06 de maio de 2009