sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

V x K

(Umberto Eco, Apocalípticos e Integrados)

"Mas no panorama da cultura de massa não se pode dizer nem mesmo que a uma sequência de mediações e dos empréstimos se estabeleça num setido único: não é apenas o Kitsch que toma de empréstimo a uma cultura de proposta estilemas que inserirá nos seus débeis contextos. Hoje [1965], é a cultura de vanguarda que, reagindo contra a situação maciça e envolvente da cultura de massa, toma emprestado do Kitsch os seus estilemas; e não faz outra coisa a pop-art, quando individua os mais vulgares e pretensiosos dentre os símbolos gráficos da indústria publicitária e os transforma em objeto de uma atenção doentia e irônica, ampliando-lhes a imagem e citando-a no quadro de uma obra de galeria. Vingança da vanguarda contra o Kitsch, e lição da vanguarda ao Kitsch, porque nesses casos o artista mostra ao produtor de Kitsch como se pode inserir um estilema estranho num novo contexto sem pecar no gosto [arg!]; e a marca da fábrica de bebidas ou a lânguida estória em quadrinhos, uma vez objetivadas pelo pintor numa tela, adquirem uma necessidade que antes não possuíam.

Mas mesmo aí, comumente, não tarda a vingança do Kitsch sobre a vanguarda: porque já vemos o processo da pop-art sendo mutuado pela cartazística, que utiliza, para provocar efeitos e ostentar alto nível de gosto, os estilemas da nova vanguarda, e assim produz novo Kitsch. E isso não é mais que um episódio do fenômeno, típico de toda sociedade industrial moderna, da rápida sucessão dos padrões, pela qual, mesmo no campo do gosto, toda inovação corre o risco de tornar-se produção de um hábito e de um mau hábito futuros."

2 comentários:

Nida Ollem disse...

você não escreve mais? cadê textos autorais?

Pedro Camacho disse...

quem não entendeu Salvador Dalí não entendeu o século XX. como por exemplo esses bichas que você cita.

o dinheiro é sagrado.

"o homem é a hipérbole do animal" (murilo mendes)

abrá.