sábado, 11 de abril de 2009

A vizinha

Preparei um chá e fui à janela.
O ar estava frio.
Como sempre, nesse lado do edifício, o vento soprava rastejando pelas paredes. Meu rosto e minhas mãos recebiam aquele contato com suave prazer.
Ao redor, havia muitas janelas apagadas e a noite.
Tomei uns goles e um pouco de ruído da cidade.

Faz pouco tempo que vim morar aqui. Não conheço os vizinhos e nem me esforcei.
Se a mulher que grita é nova ou velha, não consigo distinguir.
No silêncio das luzes trancadas em suas casas, facilmente surgia a discussão de algum andar acima.
Chá de camomila com vento...
Mais um gole e os gritos.

Realmente não dá para saber de onde vem a briga.
Os telhados olham para cima atentos.
A árvore ao fundo também escuta.
Solitária, a árvore sente a brisa fresca e não se mexe. Parece mesmo é que não sente nada, sob o olhar de tantas janelas e tantos telhados, bem no meio do quarteirão.
As duas mãos na xícara quente e uma batida grave na lage.

Silêncio.
As luzes vão se apagando, mas nada muda.
Logo abaixo, no térreo, o gato da vizinha lambe-se em cima do muro.
De repente, ele olha para mim. As minhas luzes estão apagadas, mas ele sabe onde estou. Rapidamente busca mais acima e tenciona os músculos.
Vush! Algo esbarra em mim.
Um susto e a xícara escapa da mão.

Ouço imediatamente o barulho da porcelana quebrando. Com o susto, meu corpo recou para dentro mas eu sei o que está caído no pátio da vizinha.
Através do vidro, olho para o gato. Na beira do muro, seus olhos arregalados congelaram-no.
Sente o cheiro.
Devagar, experimento colocar a cabeça para fora. Eu sinto o cheiro.
Um gemido e o par de olhos abertos no chão.

O fundo branco arregalado dentro dos olhos...
Recuei de novo para dentro.
Sabia que a mulher se mexia.
Via seus movimentos duros, o corpo amarrado ao chão.
Não havia sangue, apenas um pouco de chá e os espasmos preenchendo o silêncio.
Algo precisava ser feito.
Duas janelas fechadas e depois a cortina.

11 de abril de 2009



Um comentário:

Nida Ollem disse...

A xícara continua caindo da mão do narrador pelo susto que leva. Seria legal se o corpo levasse a xícara. Seria um efeito de real muito bom.