quinta-feira, 8 de abril de 2010

Uma calcinha

......Foi por causa do guarda-chuva esquecido que ela apareceu. Tive que abrir a porta do prédio com minha roupa de dormir, pensando no código interno que impedia velhinhas de passear de camisola pelo corredor. Pedi para ela ir na frente, pois sabia que meu vizinho estaria espiando, sempre dava para ver a sombra pela fresta da porta. Fui obrigado: entrei grudado nela, escondendo-me com seu corpo, ela se aproveitando.
......- Sabe que acabei me esquecendo dele?
......- Sei...
......Apontei onde estava.
......- Nem chovia mais... Essas coisas quando perdem a função, perdem-se por completo.
......- Aí está.
......Sentei-me.
......- Te mandei um e-mail, não resisti. Tirando essa, só tenho mais três calcinhas. Tudo babada.
......- Já te disse que não adianta.
......- Hoje no trabalho fiquei mais de meia hora no banheiro. Pelo segundo parágrafo, não aguentei mais e corri. Ai... Soltei uns gemidinhos só para causar. Juntava minhas fantasias com aquelas caras de pirua assustada, sabia da inveja, sonhava com o pau dos seus maridos barrigudos, e tudo crescia. Minha baguinha parecia uma bolinha de gude.
......- Eu vi, só tinha dois mesmo. “E para aquelas horas, a atividade servia”...
......Ela tirou os tênis.
......Ela tirou as meias.
......Ela arriou a calça e abaixou a calcinha:
......- Não posso perder mais essa. Me chupa antes que pingue nela! - e correu até minha cadeira, de calças arriadas, pentelhos em riste. - Só mais uma vez, implorou e agarrou minha cabeça.
......Olhei aquilo brilhando, lindo. O vapor cálido arrepiou meu bigode. Suspirei tristemente e ela empenou. Abri novamente os olhos e já escorria. Tive vontade.
......Ela sussurou:
......- Não deixa cair. Essa gota sou eu... Anda, me agarra!.
......A gota escorregou lentamente por minúsculos pêlos transparentes até parar numa curva invisível da pele. Só então pude voltar a respirar e meu hálito encontrou mais uma vez sua virilha. Espremeu-se tremendo enquanto puxava meus cabelos. Ali eu vi, ela começou realmente a pingar.
......Cuspi na razão e lambi suas coxas com força, mordendo para marcar. Aquele gosto lançou-me numa lambança de recordações lascivas e noites insones.
......Rapidamente ela pôs uma perna em cima da mesa e abriu-se toda. Porém, aquilo me libertou, e me levantei:
......- Deu, aqui está o guarda-chuva. Pode ir embora. Não me obrigue a usá-lo, seria ridículo.
......- Enfia essa porra em mim se quiser, mas enfia agora! Ai, o teu pau é tão melhor que esse treco. Me come, vai. Eu vou embora logo em seguida, aí podes fazer o que quiseres, dormir que seja! E aposto que vai ser melhor.
......Confiar na palavra de uma nifomaníaca é o mesmo que enrabar uma vaca: sempre dá merda. Mesmo assim não deixa de ser muito bom e acabei derrapando na curva.

......Ela foi embora acenando com o guarda-chuva... e sorrindo.

......No dia seguinte, enquanto lia um comunicado do condomínio e tomava café, vi a calcinha que tinha salvado. Dessa vez não podia ceder: fui até o fogão. Aquele pedaço de pano listrado queimava e eu já tinha o e-mail que mandaria: não mais que duas linhas!

30-março-2010

terça-feira, 6 de abril de 2010

Sobre a TV (ainda hoje)

Possibilidades reais:
- Atender às exigências do público ao mesmo tempo que gera demandas;
- consequentemente reproduz a ordem vigente ao mesmo tempo que reforça o padrão.

Análise decorrente:
- Existem várias formas de descanso. Uma delas prevê a inação, a recepção passiva, dá a sensação de participação na contemporaneidade e de liberdade pela instanteneidade da informação (como se dissesse: está acontecendo agora, nisso posso agir; mas esse raciocínio entra em grave choque com sua principal caraterística, a passividade), continuando, prevê o aprendizado moral por exemplos (como novelas e seriados; entenda-se moral no sentido filosófico de comportamento social correto do indivíduo; tendo por correto o que o tal exemplo disser que é correto), etc;
- Como a internet, ou qualquer outra ferramenta informacional, a TV contém em si um potencial emancipatório gigantesco. Por razões óbvias, esse potencial é reduzido ao mínimo tolerável numa sociedade democrática (seria o caso, pelas tais óbvias razões, de ampliar a generalização para qualquer tipo de sociedade de castas).
- Diferente da internet, a TV "instrui"/diverte/realxa milhares de pessoas ao mesmo tempo com a mesma mensagem. Modo esse que vai ao encontro da pedagogia industrial vigente nas Escolas e que busca educar um trabalhador padrão, seja para a indústria, para a universidade, para a prestação de serviços.
- O tempo que se passa aí pode ser enorme em relação ao tempo livre dadas as obrigações que uma pessoa tem (trabalho/escola, sono/necessidades vitais). Podendo resultar numa simples equação: tempo livre = inação/passividade/relaxamento acrítico/aprendizagem moral padrão.
- O imediatismo do audiovisual televisivo assegura o reinado da preguiça?

Se alguém não sabe que existe outras formas de usar o tempo livre, de descansar, de se divertir, se ela está bem acomodada e acostumada com essa única alternativa (ou com essa boa e fácil alternativa), a aceitação é simples e indolor.

Soa um raciocínio simplório até, mas quando se observa a quantidade de residências com TV (94% dos brasileiros), a demanda por TV paga (8%) e a enchurrada de promoções de aparelhos com tecnologia digital (a preços simplesmente absurdos!!!), aí se vê até onde vai o poder daquelas duas possibilidades citadas acima.

Para concluir a postagem, já que não me canso de reclamar do que é a TV hoje (tenho clara idéia do que ela pode ser), vou transcrever o final da seção A média dos gostos e a modelação das exigências do livro de Umberto Eco, A&I (lembrando que foi publicado em 1965):

"Talvez a TV nos esteja levando unicamente para uma nova civilização da visão, como a que viveram os homens da Idade Média diante dos portais das catedrais. Talvez, como foi sugerido, passemos a impregnar gradativamente os novos estímulos visuais de funções simbólicas, e nos encaminhemos para a estabilização de uma linguagem ideográfica.

Mas a linguagem da imagem sempre foi o intrumento de sociedades paternalistas, que subtraíam aos seus dirigidos o privilégio de um corpo-a-corpo lúcido com o significado comunicado, livre da presença sugestiva de um "ícone" concreto, cômodo e persuasivo. E por trás de toda direção da linguagem por imagens, sempre esteve uma elite de estrategos da cultura, educados pelo símbolo escrito e pela noção abstrata [grifo meu]. Uma civilização democrática só se salvará se fizer da linguagem da imagem uma provocação à reflexão crítica, não um convite à hipnose."